Rose Frigeri, da bancada do PT Caxias, fala sobre política e sobre seu mandato
Conversamos com a vereadora Roselaine Frigeri, sobre questões ligadas à cidade de Caxias do Sul, ao mandato dela e à sua visão de política. O resultado foi a entrevista que segue.
Rose – Sou formada em Direito e em História pela Universidade de Caxias
do Sul, com especialização em sociologia e mestrado e História do Brasil.
Trabalho cível, com direito de família e em questões de cidadania italiana.
Sou vinculada ao Partido dos Trabalhadores há 40 anos.
Como iniciou tua vinculação com a política?
Rose – Sempre tive um convívio muito próximo com a política. Minha
estreia nesse campo foi em 1974, quando concorri para o Grêmio Estudantil do
Grupo Escolar Clemente Pinto. Naquela época a ditadura militar tinha acabado
com os grêmios estudantis na forma como funcionavam. Passaram a chamá-los,
Centros Cívicos. Andava-se com o mapa do Brasil no peito, tinha-se que hastear
a bandeira nacional, cantar o hino.
Um ano após entrar para a universidade, me vinculei ao movimento estudantil.
Paralelamente, sempre estive envolvida com a questão do movimento de mulheres.
A vida política, a militância social, me perseguem desde criança. Lembro que,
quando faltavam quatro dias para eu completar sete anos de idade, estávamos
jantando e meu irmão foi preso pela ditadura militar. Ele foi preso político
aos 16 anos e ficou mais de um ano detido. Meu pai era do Sindicato dos
Metalúrgicos na época em que houve a intervenção dos metalúrgicos. Lembro
muito bem dele fazendo um buraco no porão de casa para esconder livros e
documentos. Eu tinha entre sete e oito anos. Lembro de ter ido no Dops visitar
meu irmão quando estava preso.
Caxias tem vivido questões atípicas na política. Como te manifestarias sobre a tentativa de cassação do mandato do vereador Fantinel, sobre a questão levantada contra o vereador Lucas Caregnato, sobre o pedido de impeachment do Prefeito Adiló e sobre a censura à entrevista do Frei Beto?
Rose – Infelizmente, Caxias anda famosa negativamente. Se olharmos
a história da cidade, veremos que nem sempre foi assim. Ela já elegeu
prefeitos progressistas, tivemos Mansueto Serafini, tivemos Pepe Vargas.
Enfim, Caxias é uma cidade que tem valores conservadores, mas ela abriga
moradores de muitos lugares, tem uma mescla de diferentes culturas. Então, não
podemos dizer que é 70% ou mais bolsonarista, pois na verdade a gente também
tem uma história inclusive de luta. Nós temos a história de luta do Sindicato
dos Metalúrgicos. As União das Associações de Bairros de Caxias é uma das mais
fortes do estado. Então não dá para dizermos que a cidade seja
bolsonarista/fascista [eu uso os dois termos como sinônimos]. Agora, quando
vemos fatos como o da censura ao Frei Beto, com manifestação de famílias,
sendo que o evento sequer era realizado pela escola e muito menos para os
estudantes – era uma locação de espaço –, temos uma situação muito triste para
a cidade. Ela se tornou palco nacional de um grande vexame. A repercussão
atingiu rádio, televisão, jornais, redes sociais... do país todo. Para o
evento em si, não houve problema maior, porque foi um sucesso completo. Temos
que valorizar a UCS que cedeu seu espaço, cumpriu seu papel de
Universidade..., mas para a democracia e para a cidade, tivemos, na minha
avaliação, uma perda muito grande. Temos que considerar que aquele
abaixo-assinado foi criminoso, porque foi fascista, xenofóbico, misógino, se
avaliado com empenho seria, inclusive, caso de judicialização. Houve, também,
uma decepção muito grande com o fato de uma direção de escola ceder a isso.
Aqui se insere, também, a não cassação do vereador Fantinel. O fato virou
sinônimo de fala infeliz, né? Agora, falas criminosas viraram sinônimo de
falas infelizes. Foram falas criminosas por serem fascistas,
xenofóbicas.
Mas, talvez, ninguém tenha se apercebido do mais grave: ele fez aquela fala para justificar um trabalho escravo, que é um outro crime. O trabalho que ele tentou justificar é escravo, embora estejamos falando da escravização contemporânea.
A escravização, na história, teve diversas formas. Não é preciso, hoje, ter
uma argola ou levar chicotada para dizer que o trabalho é escravo. Eu prefiro
esse termo ao invés de trabalho análogo à escravidão. É um trabalho escravo
contemporâneo, uma outra forma de escravização, mas escravização. E o vereador
usa essas falas para justificar isso. Então, é muito criminoso que foi feito.
Mas, infelizmente, sabemos muita gente não pensa assim. E quando se tem um
presidente eleito que empodera as pessoas a colocarem para fora o seu
preconceito, e ele é a figura mais importante do país, esses fatos se
naturalizam, que foi o que ocorreu nos quatro anos com o presidente Bolsonaro.
Quando um vereador se manifesta na tribuna fazendo apologia ao crime, deve
saber que apologia ao crime é crime. Ele não pode justificar um crime em um
espaço como esse. No caso do vereador Fantinel o que houve foi a autorização a
esse tipo de atitude. E caso a vereador seja condenado pela justiça, fica
ainda pior para a câmara, na medida em que ela naturalizou e autorizou algo
que a justiça comprovou que é um crime. Já se olhamos, comparativamente, para
o processo instalado contra o vereador Lucas Caregnato, temos uma situação
completamente diferente. Se ambos erraram, cada um na sua medida, um é caso de
cassação o outro jamais seria caso de cassação. Um fato aconteceu na tribuna,
em defesa de trabalho escravo. O outro, foi um episódio fora da Câmara, em
outra situação, completamente diferente, sem o menor viés criminoso. O
vereador Lucas estava defendendo o ingresso de uma pessoa numa audiência
pública porque alguém havia, sem razão justificada, fechado a porta de
acesso.
Rose – Eu sou professora municipal. Então, acho que essa administração
está indo na lógica do sucateamento do serviço público. E quando eu falo do
serviço público, não estou defendendo somente a questão salarial do servidor.
Há, por exemplo, a questão dos direitos trabalhistas. Esse sucateamento
provoca o quê? Primeiro, muita gente não se sente atraída a participar do
serviço público e muitos servidores públicos estão saindo em busca de melhores
oportunidades de trabalho. Recentemente foram chamados 40 guardas municipais.
Dos chamados, apenas 20 se dispuseram a assumir. E isso ocorre em todas as
áreas, mesmo as mais concorridas como medicina e enfermagem. Faltam fiscais de
trânsito, biólogos... e os que estão aí se quebram para atender a população de
forma adequada. E, todos sabemos que quem mais necessita de serviço público
são aquelas pessoas mais carentes mais vulneráveis. Então, aumentam os casos
de doenças porque não há mais atendimento adequado, não há prevenção da
saúde...
O ideal seria o investimento na saúde primária, mas antes de tu chegares numa UBS, se a população tivesse educação, cultura, lazer, esporte, outros tipos de atividade na cidade, as pessoas não adoeceriam tanto. A saúde mental é um escândalo. Nunca teve tanta gente doente nessa área.
Evitaríamos muita coisa se tivéssemos programas preventivos. Então, falta um
serviço público de qualidade. Eu acho que o grande problema da cidade está aí.
Como é possível uma fila de 30 pessoas aguardando um leito hospitalar? Tem UBS
trabalhando à luz de velas, porque não tem lâmpadas. Uma delas, no centro da
cidade [na Júlio de Castilhos], tem 20 lâmpadas queimadas. Em alguns locais,
não tem gaze, as pessoas são solicitadas a levarem de casa. Tem gente
esperando há dois anos por uma cirurgia de câncer. Tem gente com trombose, a
perna apodrecendo, e não consegue especialista.
E aí não é somente a saúde municipal. O Hospital Geral, por exemplo, é administrado pelo município e pelo estado, teoricamente. Ele atende 49 municípios da região, mas nenhuma das prefeituras contribui com os custos, e os recursos do estado também não chegam ao HG. Então, acho que o grande problema do município é a saúde, física e mental, nas formas da prevenção, da atenção básica, e da alta complexidade.
E no meio desse caos, o que seria possível fazer via Partido dos
Trabalhadores?
Rose – Atacar esses problemas passa pela educação popular, pelos
movimentos comunitários, pela cultura. A mobilização é fundamental. Como
oposição, o Partido dos Trabalhadores enfrenta limitações, tanto no
atendimento a solicitações quanto na aprovação de projetos de lei, por
exemplo. Esse é um fator limitante importante.
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