"Acredito no trabalho cooperativo, no qual as pessoas são ouvidas, respeitadas em suas diferenças, priorizando-se as que mais necessitam"

Entrevista com Luciane Francisquetti, candidata a vereadora (PT)



Luciane Francisquetti é professora municipal, trabalhando, atualmente, com crianças e adolescentes atípicos, o que todos reconhecemos, se apresenta como um grande desafio. Para a tarefa, encontra em casa o apoio dois grandes companheiros – o esposo, Erci e o enteado, Matheus. Já faz um longo tempo que milita no Partido dos Trabalhadores, embora a disposição para candidatar-se a um cargo público seja mais recente.


Por que surgiu somente agora a tua candidatura?
Agora, aposentei-me em um turno, então terei tempo para dedicar-me à candidatura, se for eleita. Sempre acreditei que devemos contribuir para a construção de uma cidade mais justa e humanitária e agora sinto-me madura para esse grande desafio, podendo oferecer um tempo de qualidade para a tarefa.

Acredito no trabalho cooperativo, no qual as pessoas são ouvidas, respeitadas em suas diferenças, priorizando-se as que mais necessitam. Uma vez que a partir desse momento tenho disponibilidade e me sinto capaz para a missão, quero ser parceira nessa construção de uma nova Caxias.
 
Teu trabalho está centrado na Educação Especial, que envolve crianças e adolescentes com algum tipo de deficiência, por exemplo, certo?

Sim, na escola regular eu atendo crianças com algum nível de deficiência intelectual. São, a título de exemplo, crianças crianças do espectro autista, crianças com alguma deficiência física, adolescentes com deficiência intelectual... que por meio de orientação especializada são incluídas no grupo de estudantes.


Considerando teu tempo de militância junto ao partido, o fato de hoje dispores de mais tempo para a política e a tua especialidade profissional, qual é a tua plataforma de trabalho como vereadora? Quais são os problemas que tu vês na cidade e quais deles pretendes atacar?
A minha principal bandeira é a construção de políticas públicas que atendam a essas crianças e adolescentes com as quais trabalho e pensar em projetos para cuidar de quem cuida. Ter um filho atípico exige muito. Ser professor(a) hoje é um desafio, principalmente ao atender crianças e adolescentes com necessidades especiais, fazendo com que o ambiente escolar seja acolhedor e os ajude em sua construção como indivíduos. O mais importante é que eles se sintam acolhidos, respeitados e amados no ambiente escolar. Esta vai ser a minha grande bandeira: a busca de políticas que contribuam com o aperfeiçoamento, com a aprendizagem, respeitando as necessidades de cada um deles.


E como pensas operacionalizar essa bandeira?
Nós precisamos da parceria de várias secretarias municipais. Num trabalho associativo, não podemos ter nichos separados. Então, a primeira coisa será cobrar do poder público, para o desenvolvimento de ações que provoquem a inclusão. Por exemplo, nós precisamos que essas crianças possam ser atendidas no contraturno, com oficinas, com terapias, com atendimentos especializados... Isso é algo que deveria ser oferecido pelo poder público. Penso que o atendimento na escola é primordial, mas acima disso precisamos pensar no contraturno. Nem todas as famílias têm condições de pagar um plano de saúde e arcar com as despesas de terapias alternativas ou de outros atendimentos que as crianças necessitem, mas que o poder público precisa oportunizar a essas crianças/ famílias.

É preciso que sejam oferecidas atividades extracurriculares, que ela tenha um centro de atendimento e cuidado específico para esse público. A escola deve cuidar da educação propriamente e esse centro de atendimento deve estender esse cuidado à saúde, que passa pelo esporte, pelo lazer, pelo bem-estar dessas crianças, para que elas possam avançar conforme suas potencialidades, cada uma ao seu tempo e na sua medida. Evidentemente, não estamos falando de um centro em cada escola, mas de alguns desses centros distribuídos em diferentes regiões da cidade.


Como imaginas que isso possa funcionar para valer?
O primeiro passo para isso é a vontade política. O segundo é a humanização do olhar nessa direção. Hoje, em Caxias do Sul, temos um centro de atendimento às crianças com autismo. É um começo. As crianças são encaminhadas ao centro pelo governo municipal via Unidades Básicas de Saúde (UBSs). No centro, elas recebem acompanhamento médico neurológico e terapia. Mas o ideal é que se possa ampliar as atividades, com terapias ocupacionais, por exemplo e com outras atividades necessárias para seu crescimento.


Tens ideia do número de crianças especiais existentes no município?
No ano de 2024, houve um crescimento de 13% no número de autistas atendidos na rede municipal. O que posso garantir, empiricamente, é que ele cresce a cada matrícula. A Secretaria de Educação tem todo um acompanhamento preciso, pois recebe dados e relatórios de professores que atendem a Educação Especial, acredito que o mesmo ocorre na Secretaria de Saúde.


Além do que colocaste, o que mais o município deveria ter para cuidar de seus cidadãos com necessidades especiais?
Um município deve ter preocupação especial, por exemplo, com os cadeirantes. Caxias já oferece isso, em alguns locais. A circulação de indivíduos cegos também deve ser preocupação do poder público. Essas questões se resolvem com facilidade, por meio de calçadas, rampas, sinais sonoros, a um custo muito pequeno considerando-se a relação custo/benefício. O primordial é alimentarmos o desejo de inclusão. É olharmos para essas pessoas.

Podemos usar como exemplo de ações do poder público algumas medidas que Caxias do Sul já adotou. Crianças e adolescentes autistas são cadastrados(as) e recebem uma carteirinha de identificação denominada Ciptea  e um cordão que os (as) identifica, para que tenham prioridade nos atendimentos. Alguns estabelecimentos comerciais também usam, em locais visíveis, a relação de clientes preferenciais, que vai além das gestantes e dos idosos. Educar as pessoas nesse sentido é um processo, não acontece de um dia para o outro, daí a importância de olharmos para essa questão pensando na cidade toda, contribuirmos, independentemente de leis ou projetos, mas como cidadãos, né?

A partir do momento que tu vês a criança, o adolescente ou um adulto identificado e que tu respeitas a prioridade dele no atendimento, já estás contribuindo para que a inclusão ocorra. Se o município tiver dados cadastrais atualizados e se as pessoas tiverem acesso às informações, isso também será uma forma de contribuir para que essa inclusão de fato ocorra.


Fala-se muito em educar o autista, em integrá-lo, em adaptá-lo a escolas regulares. Não deveria haver, também, o processo inverso: educar as pessoas para o convívio com pessoas especiais? Tu ensinas o “regular” a se ver como autista?
Isso é um processo. Se nós pensarmos na escola, ao recebermos uma criança ou um adolescente com diagnóstico do espectro autista, o que que nós temos que fazer? Primeiro acolher e acolher significa conhecer um pouco da sua funcionalidade, para que nós possamos atendê-lo; para que nós possamos fazer com que aquele ambiente escolar seja o melhor pra ele. Nós é que devemos nos adaptar. Isso parte do respeito. Por exemplo: há crianças que têm sensibilidade auditiva muito alta com relação ao barulho. Se eu sei disso, vou tentar naquele ambiente fazer com que se use um tom mais baixo, né? Quando essa criança está próxima, devo saber que um grito poderá desestabilizá-la. Nós temos que aprender juntamente com elas. Deve existir essa educação para a turma.

Tanto os estudantes quanto o grupo docente, precisam desse suporte. Então, isso diz respeito ao meu fazer pedagógico. Na reunião de professores, faço um relatório acerca de cada um dos estudantes, destacando aquilo que eles são capazes de desenvolver de forma autônoma e aquilo em que precisam de maior acompanhamento. Isso é feito junto aos docentes. Depois, a gente também faz um trabalho com a turma para explicar que nenhum de nós é igual ao outro. Todos nós temos nossas diferenças. Todos nós temos nossas dificuldades, nossas potencialidades. A partir do momento em que eles sabem como é que “funciona” aquele colega ou de que forma eles podem fazer com que aquele ambiente, seja tranquilo e favoreça a permanência daquele colega especial no ambiente escolar, teremos obtido “toda a diferença”.


Uma vez eleita e iniciado teu mandato como vereadora, qual seria teu primeiro projeto?
Meu primeiro projeto seria buscar parcerias junto às universidades, às faculdades e junto ao poder público para a construção do centro de atendimento ou de centros de atendimento regionalizados dedicados a esse público e a suas famílias. Sabemos que a maioria das famílias desses estudantes não tem essas condições e não consegue pagar um plano de saúde que acesse os cuidados necessários. Hoje, poucas crianças/adolescentes conseguem esse tipo de atendimento via encaminhamento por Unidade Básica de Saúde ao Sistema Único de Saúde.

É muito importante ouvir as mães, os pais, os cuidadores, para que de fato se construa aquilo que é necessário. O que eu trouxe aqui é a minha visão, mas o diálogo é muito importante, para que de fato se construa aquilo que é necessário. Então, com esse projeto, penso que devemos criar uma associação de pais. Um ente que agregue as famílias dessa população. Esse será uma forma de darmos visibilidade a crianças/adolescentes especiais e suas famílias e de definirmos as prioridades para esse grupo.


Há outras questões com as quais pretendes te envolver mais intensamente?
Moro no Bairro Madureira, mas minhas raízes são de Vila Oliva, região onde cresci.  Tenho fortes vínculos, também, com Vila Seca. Por conhecer muito bem as necessidades e dificuldades das famílias do interior, pretendo trabalhar muitas questões que propiciariam a permanência do homem e cda mulher no campo.

Em função dos recentes eventos climáticos que abalaram o Rio Grande do Sul, os moradores  do interior enfrentam muitas dificuldades. Eles foram muito atingidos, tanto na produção propriamente quando no escoamento do que conseguiram salvar. Essas localidades precisam de atenção ao atendimento na Saúde, por exemplo. A infraestrutura local nesse setor é limitada e o deslocamento é difícil. Para piorar o quadro, a comunicação é precária. O acesso à internet é muito deficitário, telefones fixos e móveis têm problemas sérios com o sinal...  Por isso, para que ocorra a permanência de homens e mulheres no campo, é fundamental que existam políticas públicas que contribuam com a melhoria da qualidade de vida, asseguirando-lhes viver e trabalhar de forma digna.

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